Um carioca domingo - sangrento num molde irlandês

Morreu na contramão não atrapalhando, muitas horas, o tráfego; caiu causando estrondo, sem ferir muitos olhos, sem alarmar o domingo de sol banhado, ali na esquina, por todo aquele mar plácido.
Quem era, por que sua existência, agora coberta por um pano branco, tinha traços de ironia musicada? Um refrão de "Sunday bloody Sunday" que era sussurrado sem lamentos, por quem talvez não estivesse abalado devido ao poder da calmaria mágica do entorpecimento das aventuras recentes.
Aquelas árvores, na rua que corre atrás do hotel Pestana, viram mais que nós, que apenas tivemos um ignoto grito como referência.
As investigações despretensiosas, muito pela garantia de que ao descer os sete andares já teríamos respostas, foram portanto um momento a ser considerado vivido intensamente.
E fomos, atrás do doce caldo de cana, no típico passeio à feira, ainda sem saber de muito, mas conjecturando o mais óbvio dos fatos suscitados: suicídio! Da janela da festa, da janela da dor, da janela incerta, pulou uma alma de encontro ao desconhecido. Quanta dor se guarda para ignorar aquela areia, aquela gente bonita, aqueles bares cheios de sorrisos no domingo?
"Você viu, o cara pulou do hotel?" , com um gesto que para a construção daquela não "buárquica" construção, o movimento indicando o salto se tornou algo, erroneamente, hilário.
As ideias se concatenaram, aparentemente, a fim do alcance da resposta e conclusão plausível ao que realmente acontecera. Mas o rosto embaixo daquele alvo, deveras ensanguentado, pano comum, jamais seria visto por nós, nem uma nota no jornal acena quem visitou o céu ou, quiçá, o inferno tão recentemente.
Andares à frente, olhos que miravam o mar e abaixo, sabíamos que o sopro da vida já findou por ali... e que a areia que somos, apenas areia, neste vento efêmero da vida, poderia ainda estar calçando aqueles pés - agora "juntos"-  rumo ao desaparecimento eterno.
Vai o dia, o sol apoia a calmaria, ali, por horas o desconhecido esperava sua partida, país distante ou alguma periferia?
Copacabana continuou recebendo as línguas de seus visitantes afoitos e imersos em seus deslumbramentos, o hotel ainda vibra com a energia de seus hóspedes (e alguma janela coma força de um mergulho intenso). Aquele desconhecido, tornando-se então tão íntimo, sem nome, fará parte para sempre de nossas vidas. Quem sabe, saber disso, poderia tê-lo salvado!
 E se esse finado personagem da vida real era um flamenguista , escolheu um bom horário para aposentar suas chuteiras, evitou a raiva de uma tarde inteira.

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