Um filme para Scorsese

Desse caminho eu observo e tenho marcadas na mente e na pele cada ponta de pedra, cada caco de vidro, cada palavra pensada, cada mentira bondosa, cada afeto gratuito e cada espelho repetidos. 
No drama que crio, prontos e vestidos os personagens se encarregam de fazer suas melhores humanidades. Nas minhas conquistas antigas vejo alguns pingos do que eu poderia ter sido, num espectro do que talvez eu seja. 
Bandeiras, sem ar, ficam sem nacionalidade nas ruas percorridas, se olho adiante as revejo, nenhuma brisa move as estrelas de alguns palcos em que dancei, ou sonhei que o fazia.
Ainda viva, queria Scorsese me dirigindo, para posteridade desses afazeres infantis de escrever o leite derramado. 
Ponha uma roupa, veja o sol! A porta deve ser trancada, lembro-me, melancolicamente, por enquanto.
Para alguns, facilitam-se as passagens, mais tempo, menos raiva, mais criatividade. Guardo meus preconceitos agora bem encaixotados, perigosos para mim e para mundo. 
Talvez, a qualquer momento paire um apogeu ou fim dos tempos, desejo nada, agora menos que nada. Nos teclados que uso faltam acentos, recorro ao que tenho, palavras frias, luzes para apagar, mais de mim, em mim mesma, peso que eu sei o que custa para aguentar.

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